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Identificadores e layouts:

Talvez você não saiba o que são, mas sem eles não há pagamento
do_Rio

Um aspecto que ganha mais relevância do que nunca neste momento em que 100 mil novas canções são subidas todos os dias às plataformas de streaming é a necessidade de uma corretíssima identificação das obras. Sem ela, os titulares de direitos autorais não recebem os valores a que têm direito, prejudicando compositores e outros profissionais que são a base e o motor da indústria.

Talvez você não saiba, mas, por trás dessa identificação, existe um complexo sistema de códigos e siglas que orientam as partes interessadas — sociedades de gestão coletiva, gravadoras, DSPs (provedores de serviços digitais, ou seja, plataformas de streaming) — no manejo da informação e dos pagamentos. Esses códigos são estandarizados e adotados internacionalmente, precisamente para permitir que diferentes players do mercado consigam conversar entre si.

“O momento do onboarding dos dados, ou seja, do embarque dos dados no sistema é crucial. Se algo dá errado, vai impactar tudo o que vier dali em diante. Por isso a identificação é uma parte central da indústria musical”, diz Peter Strauss, gerente de Relações Internacionais, Distribuição & Licenciamento da UBC.

Os identificadores relacionados às obras e aos autores são cinco:

ISRC (International Standard Recording Code, ou Código Padrão Internacional de Gravações) – É um número único e global que distingue um fonograma (ou seja, uma música gravada) de todos os outros. O código segue um padrão eletrônico alfanumérico internacional de 12 caracteres, dividido em quatro elementos que representam o país, o primeiro proprietário da gravação (ou seja, o produtor fonográfico), o ano de gravação e um sequencial. Cada fonograma só pode ter um ISRC — o que o torna uma espécie de impressão digital de uma música gravada. Até há uns anos, quem gerava o ISRC no Brasil eram basicamente o Ecad e suas sociedades — entre elas a UBC. A crescente agilidade necessária para gerir tanta música gravada que vem sendo produzida e publicada trouxe outros players a essa história: os agregadores ou distribuidores digitais.

Diversos agregadores vêm sendo habilitados pela Federação Internacional da Indústria Fonográfica (IFPI), responsável pelo código, para gerar o ISRC mundialmente. No nosso país, quem media essa relação é a Pro-Música Brasil, a associação dos produtores fonográficos, que tem o título de agência ISRC por aqui, ou seja, é a instância máxima para o tema no âmbito nacional.

Tanto os agregadores habilitados pela IFPI/Pro-Música como as sociedades de gestão coletiva — a UBC entre elas — são considerados gerentes de ISRC. Portanto, de onde quer que venham os códigos, desde que criados por gerentes de ISRC, são considerados igualmente válidos.

Porém, é importante que o produtor fonográfico, “dono” do fonograma e responsável pelos trâmites que lhe garantirão rendimentos de direitos autorais, esteja atento a um passo-chave. Caso ele gere o ISRC num agregador/distribuidor e já comece a mandar seu fonograma às plataformas, é importante também que faça o cadastro na UBC ou em qualquer outra das sociedades que compõem o Ecad. Essa etapa é vital para que os direitos autorais arrecadados pelo streaming sigam o caminho correto até chegar aos titulares.

ISWC (International Standard Musical Work Code, ou Código Padrão Internacional de Obra Musical) – Também é um identificador único, com uma série de números, que contém informações sobre a obra em si. Este é gerado pelo Ecad e disseminado para as sociedades que têm titulares envolvidos na obra, para que elas possam identificar cada um deles na hora de fazer o pagamento quando essa obra for usada. “A Cisac tem um projeto de disseminação de ISWC que vem tendo adesão das grandes editoras e que vem melhorando a identificação das obras novas, pois a codificação é feita de forma mais rápida, fazendo com que a identificação das obras não falhe”, afirma Fabio Geovane, Diretor de Operações da UBC.

IPI (Interested Parties Information, ou Informação sobre as Partes Interessadas) – É uma base de dados de titulares autorais com seu nome, pseudônimos, tipo de produção de obra (literária, dramática, musical), filiações às sociedades de cada direito e território dessa administração. Conta com dois códigos para identificar o titular: CAE, um código numérico único para cada um dos nomes utilizados pelo autor/editor, também conhecido como IP Name Number; e também o IP Base Number (que começa com a letra I e tem o formato I-XXXXXXXXX-X), único para cada titular, independente dos nomes que o mesmo utiliza. A intenção desse código é identificar o titular nas bases de dados das sociedades de gestão coletiva do mundo todo, diferenciar homônimos e administrar as filiações e movimento dos titulares entre sociedades e/ou territórios de administração das mesmas. Ou seja, se ISRC e ISWC são o RG do fonograma e da obra, os dados contidos na base IPI são a identidade do próprio autor/compositor.

IPN (Internacional Performer Number) – Este identificador se refere ao intérprete (voz e instrumentos), portanto, é essencial para o manejo de dados referentes ao direito conexo. Assim como o IPI, ele é particularmente relevante na hora de, por exemplo, distinguir dois intérpretes com o mesmo nome e administrar as filiações e os movimentos de titulares entre sociedades.

IFPI (Federação Internacional da Música Gravada) – A IFPI gera um código de identificação do produtor fonográfico, que é o “dono” de uma gravação musical. Portanto, esse código costuma ser adicionado ao ISRC, para que não haja nenhum erro na hora de saber a quem pertence o fonograma.

Além desses cinco identificadores, há também layouts de arquivos eletrônicos, que servem para uma sociedade ou parte interessada comunicar determinados processos a outra sociedade ou qualquer outro player da indústria, como os DSPs/streaming ou as gravadoras.

“Os layouts são a forma como os identificadores se disseminam pela indústria corretamente. São eles que carregam a informação que precisa chegar a todas as partes interessadas para que tudo funcione”, diz Peter Strauss, que destaca alguns dos mais importantes:

CWR (Common Works Registration) — As trocas de dados entre sociedades e editoras se dão através de processos tecnológicos que são organizados de modo a evitar confusões no registro das obras musicais. Um desses métodos é o CWR, basicamente um formato para intercâmbio de metadados das obras musicais. Fundamental para sistematizar o envio de repertórios muito grandes de editoras à UBC.

E4/F2/M3 e CRD — São formatos utilizados pelas sociedades para fazer o intercâmbio de dados sobre a distribuição de rendimentos de direitos autorais. É como se fosse um demonstrativo eletrônico de distribuição de uma sociedade para a outra. O E4 contém o demonstrativo de execução pública (por exemplo, em rádio ou shows); o formulário F2 contém execução pública em obras audiovisuais (e, portanto, precisa de campos adicionais); o M3 contém o demonstrativo de pagamentos de direitos de reprodução (fonomecânico), como, por exemplo, os da gravação de um disco. Já o formato CRD foi criado para, pouco a pouco, substituir os formatos acima e consolidar todos os tipos de pagamentos e direitos em um layout único. Sua adoção ainda não é universal; portanto, todos estes formatos são utilizados atualmente, e é possível converter as informações de um para outro.

Nessas trocas de dados, os identificadores numéricos citados anteriormente são fundamentais para facilitar o reconhecimento de obras e titulares. Quanto melhor a qualidade dos dados desses arquivos, mais ágil se torna a distribuição pela sociedade receptora, já que isso permite fazer identificações automáticas.

DDEX (Digital Data Exchange) — É um formato de troca de metadados fruto de um consórcio de partes interessadas no comércio digital e, por isso, foi amplamente adotado nos intercâmbios de dados entre DSPs (Provedores de Serviços Digitais) e administradores dos direitos utilizados no negócio desses serviços. Na indústria musical, é comum que DSPs informem via DDEX os seus relatórios de uso, ou seja, uma lista completa e detalhada de todas as gravações de obras musicais utilizadas ou acessadas em um dado período, bem como o valor monetário associado a cada uso. Para os administradores dos direitos (como a UBC), é necessário saber ler esse formato e gerar “arquivos resposta” contendo as transações sobre as quais o administrador tem algum percentual. A partir disso, é possível definir esse percentual para que o DSP possa saber quanto deve pagar ao administrador. O DDEX está em constante evolução para atender a mais indústrias no âmbito digital e também para lidar com o grande volume de dados e tamanhos de arquivos resultantes.

A evolução desses identificadores nos últimos anos

Com toda essa complexa rede de identificadores e layouts, é fácil que uma parte interessada “bata cabeça com a outra”. Segundo Strauss, é por isso que há conversas constantes entre os diferentes membros da indústria para a adoção de melhores padrões que possam ser compreendidos por todos.

“É fundamental que seja assim, a era digital tornou tudo muito acelerado, não podemos mais perder anos antes de fazer mudanças”, afirma.

Para Fabio Geovane, “nossa identificação é boa, é de mais de 85% no Spotify, por exemplo.” Segundo ele, os problemas pontuais que podem existir estão “nas obras novas, com menos execuções, e nos titulares que não têm noção da necessidade de uma boa documentação junto ao DSP/streaming e junto à sua sociedade.”

Geovane ainda reforça:

“É muito importante que os titulares tenham conhecimento de seus direitos e façam o cadastro dos dados de suas obras e fonogramas de forma completa e com a melhor qualidade possível. Esse é um trabalho que muitas vezes é deixado de lado e que é de vital importância.”

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