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SINTONIZANDO

O FUTURO

Como o rádio está retomando o protagonismo ao abraçar o digitalpor_ Eduardo Lemos de_ Londres
Luiz Fernando Vianna
foto_ divulgação
O jornalista e coordenador da Rádio Batuta, Luiz Fernando Vianna

Como o rádio está retomando o protagonismo ao abraçar o digital

por_ Eduardo Lemos de_ Londres
Luiz Fernando Vianna
foto_ divulgação
O jornalista e coordenador da Rádio Batuta, Luiz Fernando Vianna

As plataformas de streaming se tornaram o meio natural para ouvir novas canções ou até consumir informação através de seus podcasts em multiplicação. Por que é, então, que tanta gente continua a ouvir rádio? Mais que isso: por que é que o número de ouvintes do velho dial voltou a crescer?

Nos últimos dois anos, o mercado global de rádio parou de perder audiência, como mostrou em setembro o estudo “Audiência de Rádio: Uma Janela de Oportunidade”, publicado pela consultoria britânica MIDiA Research. A fuga de ouvintes foi intensa na década passada, marcada pela massificação das redes sociais e das plataformas digitais, e teve seu auge durante o confinamento da primeira fase da pandemia – reflexo, talvez, da queda dramática no número de deslocamentos de carro, um momento intrinsecamente ligado à experiência de ter o rádio ligado.

O controle do vírus e o retorno ao trabalho presencial, porém, mudaram radical e subitamente esse panorama, e os ouvintes têm retornado aos milhões em todo o mundo.

Além de estancar a queda de audiência, o mercado de rádio está agora conquistando novos público - num ritmo lento, é verdade, mas estável. "Com o declínio da audiência de rádio diminuindo, e até mesmo experimentando uma modesta recuperação, existe uma janela de oportunidade para as empresas de rádio se tornarem donas de seus próprios destinos”, preveem os pesquisadores Tatiana Cirisano, Keith Jopling, Annie Langston e Mark Mulligan, responsáveis pelo estudo.

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O QUE AS WEB RÁDIOS TÊM DE MELHOR PARA OFERECER SÃO PRODUTOS ÚNICOS E COM CURADORIA.”

Luiz Fernando Vianna, jornalista

AspasO QUE AS WEB RÁDIOS TÊM DE MELHOR PARA OFERECER SÃO PRODUTOS ÚNICOS E COM CURADORIA.”

Luiz Fernando Vianna, jornalista

O digital não é concorrente, é aliado

Para o consultor na área digital de rádio Daniel Starck, as empresas estão entendendo que a internet é uma aliada importante para a ampliar a operação que até recentemente ficava restrita ao dial. É cada vez mais comum um programa ir ao ar no rádio e, logo depois, estar disponível nas plataformas digitais. Alguns programas até aderiram ao vídeo e transmitem suas edições ao vivo pelo YouTube.

“Com o digital, o rádio consegue abraçar mais momentos diferentes da rotina de seu ouvinte, dando mais possibilidades para que ele fique ligado de alguma forma à emissora. E isso vai desde o streaming à transmissão via dial e à presença em diferentes plataformas, sejam portais, aplicativos e mídias sociais. Conforme a entrega de conteúdo e a presença do rádio no digital foram aprimoradas, as pessoas passaram a consumir o rádio via dial (a depender do momento do dia do ouvinte)”, explica Starck.

Este auge atual do áudio como formato de conteúdo é outro fator que explica esta retomada. Com cada vez mais pessoas habituadas a ouvir podcasts e audiobooks, ficou mais fácil se conectar ao rádio, já que o áudio é, digamos, a especialidade da casa.

Daniel Starck
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Daniel Starck, jornalista e consultor na área digital de rádio

"O rádio inventou a popularidade do áudio”, resume João Marcello Bôscoli, produtor musical associado da UBC e apresentador do programa diário “Sala de Música”, na Rádio CBN/Globoplay, além do semanal “Contraponto”, na Rádio Cultura.

O próprio “Sala de Música” costuma chegar às plataformas digitais minutos depois da execução ao vivo. "Quando comecei, só poderia me ouvir depois se deixasse o programa gravando”, diz Bôscoli. "As rádios estão produzindo 24 horas de programação durante sete dias por semana, como sempre fizeram, mas agora elas publicam quase na íntegra esse conteúdo nas plataformas e mantêm um aprimoramento contínuo dos seus métodos de distribuição e promoção. Há também um trabalho permanente [de divulgação] nas redes sociais. É um salto tecnológico dos mais significativos no setor.”

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O RÁDIO TEM UM PAPEL NA MANUTENÇÃO DE UM TEMPO MAIOR DE SUCESSO DOS ARTISTAS, ASSIM COMO ATINGE MAIS PESSOAS.”

Daniel Starck, consultor

AspasO RÁDIO TEM UM PAPEL NA MANUTENÇÃO DE UM TEMPO MAIOR DE SUCESSO DOS ARTISTAS, ASSIM COMO ATINGE MAIS PESSOAS.”

Daniel Starck, consultor
Daniel Starck
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Daniel Starck, jornalista e consultor na área digital de rádio
João Marcello Bôscoli
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João Marcello Bôscoli, apresentador de dois programas de rádio

O desafio de renovar a audiência

Liberar seus conteúdos para qualquer um consumir é o rádio acenando para o público de 16 a 24 anos, faixa menos familiarizada com o meio. "O rádio historicamente atende aos ouvintes, isso sempre foi um foco de muita atenção, gerando até departamentos para cuidar dessa gestão. Essa parte do modelo também foi ampliada. Agora, os ecossistemas estão integrados, e os processos, fluentes”, observa Bôscoli.

João Marcello Bôscoli
foto_ divulgação
João Marcello Bôscoli, apresentador de dois programas de rádio

De acordo com dados divulgados em maio pela Tech Survey 2022, tradicional pesquisa que analisa o consumo de rádio nos Estados Unidos, o ano de 2022 marcou a menor diferença entre o número de pessoas que escutam rádio via receptores AM/FM (65%) e aqueles que o fazem de maneira digital (35%). Em 2013, esta distância chegou a ser de 85% a 13%, respectivamente. “O rádio é cada vez mais um meio híbrido, entre on e off, imagem e áudio”, avalia Daniel Starck.

Esta aproximação entre analógico e digital representa uma oportunidade para o rádio fisgar novas audiências, segundo Fred Jacobs, presidente da consultoria Jacobs Media, responsável pela Tech Survey. "Estamos tão presos à faixa etária de 25 a 54 anos, que simplesmente ignoramos quem tem menos de 25, porque presumimos que eles estão felizes com as plataformas digitais. Mas pode haver vulnerabilidades que não conhecemos e não entendemos”, aposta.

A resiliência da radiodifusão também aparece no relatório global do IFPI sobre hábitos de consumo de música em diversos países, incluindo o Brasil. Divulgado em novembro, o estudo revelou que 17% dos entrevistados escutam música via rádio (contra 19% que o fazem por meio das redes sociais e 24% que preferem um serviço de streaming).

AspasAS RÁDIOS ESTÃO PRODUZINDO 24 HORAS DE PROGRAMAÇÃO, MAS AGORA PUBLICAM ESSE CONTEÚDO NAS PLATAFORMAS.”

João Marcello Bôscoli, produtor e apresentador

AspasAS RÁDIOS ESTÃO PRODUZINDO 24 HORAS DE PROGRAMAÇÃO, MAS AGORA PUBLICAM ESSE CONTEÚDO NAS PLATAFORMAS.”

João Marcello Bôscoli, produtor e apresentador
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foto_ JP Farias
Equipe da Rádio Veneno, em São Paulo: mais de 600 artistas já passaram por lá

Uma oportunidade para as rádios online

Com mais pessoas procurando o rádio para escutar música - e uma parte delas fazendo isso pela internet -, quem pode se beneficiar desta onda são as web rádios.

A Rádio Batuta, do Instituto Moreira Salles, é uma das iniciativas mais longevas do segmento. Criada em 2010, oferece programação 24h de música brasileira, jazz e música clássica. Nos últimos anos, passou a produzir conteúdos originais em áudio, como o podcast "Sertões: Histórias de Canudos”, que entrou na lista de melhores produções de 2019 do Spotify e da Apple Music, e o programa “Tabuleiro”, apresentado por Maria Bethânia ao longo de 2021.

Mesmo assim, o retorno tem sido mais “qualitativo do que quantitativo”, como explica Luiz Fernando Vianna. "Não vejo um cenário de grandes audiências, porque as plataformas de streaming têm atraído o interesse de quase todos que se interessam por música. As web rádios, com programas frequentemente mais longos e que exigem mais atenção, ficam prejudicadas. O caminho é mesmo cativar públicos de nichos. O que as web rádios têm de melhor para oferecer são produtos únicos e com curadoria.”

É exatamente o que a Veneno, de São Paulo, vem realizando desde a sua estreia, em 2018. Fundada pelo DJ Rafael de Toledo, a rádio online se tornou peça central na divulgação e na documentação da música eletrônica independente produzida atualmente no Brasil. Com transmissões ao vivo e programas gravados, já passaram por lá mais de 600 artistas.

“A ideia era criar uma plataforma em que DJs e não DJs pudessem colocar um som ou qualquer tipo de conteúdo em áudio, sem ter a pressão de uma pista”, explica Toledo. Segundo o DJ, nos últimos 6 meses, a audiência da rádio cresceu 27,5%. “A gente utiliza principalmente o Instagram para atrair o público e para entrar em contato com novos produtores e artistas. Vários de nossos programas residentes surgiram a partir de diálogos no Instagram.”

Seja online ou tradicional, o fato é que o rádio é pop. Em um artigo publicado em novembro, a revista britânica Far Out defende que, “com as despesas de turnê em alta e royalties de streaming oferecendo aos artistas pouco mais do que centavos, muitos artistas estão descobrindo que a realidade da indústria da música de hoje é muito mais dura do que eles esperavam. Felizmente, há uma plataforma na qual os músicos ainda podem confiar: o rádio.”

Representação visual de ondas de rádio

“O RÁDIO SEMPRE EMBARCOU EM NOVOS AMBIENTES”

Representação visual de ondas de rádio
foto_ divulgação

Daniel Starck, jornalista, consultor na área digital de rádio e criador do site Tudoradio.com, especializado na radiodifusão brasileira, avalia o panorama e as perspectivas desse meio em constante reinvenção.

Em geral, como você vê a adaptação do rádio brasileiro ao mundo digital?

Tem sido de uma maneira muito natural. O rádio sempre embarcou em novos dispositivos e novos ambientes, seja pela própria evolução de sua transmissão (como o surgimento do FM e, posteriormente, a transmissão terrestre digital em vários países) ou pela possibilidade de adaptar o áudio aos streamings e podcasts. As emissoras de rádio sabem fazer uma boa entrega de áudio, e o desafio foi entender qual a melhor maneira de fazer isso conforme a tecnologia foi evoluindo. Outro ponto importante é a interatividade, algo que também é bem característico do rádio. Também foi algo natural utilizar novas ferramentas para manter o rádio como um amigo próximo das pessoas.

O rádio já foi o mais importante divulgador da indústria da música. Hoje em dia, há artistas que bombam sem necessariamente precisar tocar no rádio. Como você vê esta relação entre o rádio e a música?

O rádio sempre foi um curador importante no cenário musical. De fato, ele é menos usado hoje para que uma pessoa conheça um novo hit ou novo artista. Porém, como a internet é algo que mostra novidades a todo o momento, a estratégia de um produtor/artista musical deve contar de uma maneira diferente com o rádio: ele possibilitará que aquele sucesso alcance mais pessoas e fique por mais tempo em alta através do meio, já que ele é um importante veículo de alcance e frequência. Em resumo, o rádio tem um papel importantíssimo na manutenção de um tempo maior de sucesso dos artistas, assim como a possibilidade de atingir ainda mais pessoas, inclusive aquelas que não necessariamente estavam buscando algo específico.

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